“Everybody knows that our cities were built to be destroyed.”
Caetano Veloso
Difícil assumir esta constatação de Caetano na música "Maria Bethânia", pois quando se planeja uma cidade e se realiza obras, o que temos em mente é a concretização de um projeto realizado de acordo com as necessidades e tecnologias do momento. E é a aí que tudo se torna fugaz, pois tanto as necessidades quanto os recursos tecnológicos estão em constante mutação de acordo com a sociedade e o ambiente em que se vive.
Mas os bens imóveis e logradouros que adquirem o valor de patrimônio histórico, arquitetônico ou artístico de uma cidade (tombados ou não), perdem a perspectiva da fugacidade e são colocados contra a tendência natural de reconstrução das cidades.
Muitas vezes, o desejo de preservação de um patrimônio se choca com perspecivas de novos projetos para uma área urbana, e o patrimônio recebe a identificação taxativa de ser um entrave ao desenvolvimeto.
Não vou entrar na área de planejamento urbano, até porque não é minha epecialidade, mas me atrevo a dizer que não há como realizar um bom planejamento urbano dentro da dinâmica governamental instituída em nosso país, que é renovada a cada quatro anos. Este panorama piora quando os responsáveis pela área de urbanismo são mais políticos do que profissionais capacitados para trabalhar em uma área tão complexa e mutante.
E é neste panorama que as cidades vão crescendo. Pequenos vilarejos se tornam municípios, pequenos municípios se tornam grandes cidades e grandes cidades se tornam grandes metrópoles.
As áreas mais antigas das cidades são seus primeiros núcleos de edificações que formam os centros urbanos. Com o passar dos anos e crescimento das cidades, os centros urbanos, instituídos como área de maior concentração dos serviços e equipamentos de uso da sociedade, são reconhecidos também como centros históricos e novos centros de serviços e comércio são criados.
CENTROS URBANOS
X
CENTRALIDADE
Neste primeiro capítulo sobre Requalificação Urbana, vamos entender os vários processos de reconstrução das cidades e como o patrimônio era compreendido em cada período da história, a começar pelas reformas urbanas ocorridas diante do processo industrial instituído primeiramente na Inglaterra (meados do século XVIII) e que expandiu pelo mundo a partir do século XIX.
O processo de industrialização provocou o inchaço das cidades, com a migração de pessoas do campo, que abandonavam a lavoura e a manufatura para trabalharem na indústria. A crescente população se acomodava em bairros operários e nos centros das cidades, sem planejamento e infra-estrutura suficientes, ruas estreitas, precário sistema de esgotos, o que ocasionaram sérios problemas de salubridade.
Neste contexto, nasce a busca por uma cidade perfeita e racionalmente organizada de acordo com os novos parâmetros da industrialização.
O primeiro processo de requalificação foi o de EMBELEZAMENTO URBANO, no final do século XIX e início do século XX, tendo como premissas o saneamento, a higiene, a fluidez viária e o embelezamento da cidade através dos monumentos mais importantes.
Exemplos:
Plano Haussmann - Paris (1851 a 1870)
Plano de Extensão de Barcelona engenheiro Ildefonso Cerdà,1859
O segundo período de requalificação é conhecido como RENOVAÇÃO URBANA, no pós-guerra, entre as décadas de 1950 e 1960, com obras de setorização e habitacionais, seguindo as concepções da cidade moderna da Carta de Atenas.
Segundo os preceitos dos modernistas a nova cidade deveria propocionar salubridade, banhos de sol, campo livre pontuado por edifícios isolados, velocidade e higiene.
Ao mesmo tempo, foram os modernistas que reconheceram a importância da preservação das edificações do passado, como bens de valor para a história e identidade de uma sociedade. Surge então um dilema entre a tábula rasa (só a partir do vazio é possível pensar o novo) e a preservação (edifício isolado).
Muitas críticas são feitas à cidade moderna no que refere à preservação de monumentos isolados do contexto urbano, o que influenciou o terceiro processo de requalificação denominado PRESERVAÇÃO URBANA, entre os anos 70 e 80, cujos objetivos eram a valorização da memória, a organização da sociedade em defesa do patrimônio e o reconhecimento do centro como gerador de identidade e orgulho cívico.
Neste período, a globalização e a consequente padronização das cidades, estimulam o processo conhecido como "city marketing", que define a cidade como mercadoria a ser oferecida no mercado global com distinção da cultura local. Entre os exemplos do marketing city podemos citar Curitiba e o Pelourinho em Salvador.
A concorrência entre as cidades ocasiona a quarta fase de requalificação denominada REINVENÇÃO URBANA, a partir dos anos de 1990, com intervenções pontuais que qualificam a cidade, como é o caso de Bilbao e das cidades que sediaram jogos olímpicos.
Por fim, vivemos atualmente a fase de requalificação denominada de PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO, que correspondem a um conjunto de medidas que são tomadas para se atingir metas pré-definidas, geralmente como respostas a problemas de moradia, segurança, trânsito, falta de emprego ou poluição. O Planejamento Estratégico é uma ação conjunta entre os setores públicos e privados (investidores), que muitas vezes transforma um espaço urbano de interesse da coletividade em um espaço objeto de negócios.
(ESTE ARTIGO, DE AUTORIA DE ALESSANDRA BALTAZAR, NÃO PODE SER COPIADO E DEVE SER USADO EXCLUSIVAMENTE PARA FINALIDADES DIDÁTICAS)